Relação COVID-19 e Turismo: complexa e oportuna?

20 de Abril de 2020 5:02pm
Redação Caribbean News Digital Portugues
Covid19-Turismo

Um artículo de opinião de Usina Turística de Argentina publicou hoje que para o país abre-se uma possibilidade para de se posicionar como destino seguro para os turistas internos, em primeiro lugar, e paulatinamente os viajantes internacionais.

O caso da pandemia da COVID-19 está a mostrar-nos uma nova faceta dos riscos associados à construção de uma sociedade global. Estamos em presença da primeira grande crise sanitária nesta nova etapa do mundo, com um grande impacto em todos os níveis, que compara seus efeitos sociais e económicos aos de uma guerra mundial. Ao dia de hoje, os afetados já têm superado longamente o milhão de casos em quase 200 países e os mortos contam-se por dezenas de milhares.

O turismo, sector produtivo que tem sido partícipe necessário e beneficiário direto do fenómeno de aldeia global reinante até faz mal semanas, se enfrenta a uma crise de tamanhos impensados em frente a esta pandemia.

A Organização Mundial do Turismo (OMT) define ao turista como toda a pessoa que viaja fora de seu lugar de residência por um período maior a um dia, independentemente dos motivos. Analisando as datas, podemos evidenciar que a época do ano na que se propagou a doença coincide com o Ano Novo chinês, momento no que literalmente centos de milhões de chineses viajam a visitar a sua família no resto do mundo.

Seguindo com a definição ditada pela máxima autoridade em matéria turística em nível global, é possível então inferir que a propagação do vírus se viu motorizada pela deslocação de turistas.

Uma vez analisado isto, surge um interrogante: Poderia o turismo ter previsto esta catástrofe? Esta pergunta complexa, nos tienta a uma resposta mais bem singela: possivelmente não, como também não o preveniu a ciência.

No entanto, não cabe dúvida que o setor turístico é um dos mais afectados no marco desta pandemia. O notável paradoxo de vitimário e vítima, com a consequente perda de centos de milhares de postos de trabalho em hotéis, agências de viagens, restaurants, locais comerciais e a impossibilidade de rendimento para os empreendimentos particulares, com a gravidade que supõe a pouca capacidade de autonomia financeira que têm as pequenas e médias organizações, matriz baseie do setor em Argentina.

Durante anos, a atividade turística teve como paradigma o crescimento indefectible, alimentado a sua vez pelo facto insoslayable de erigirse como um importante motor de desenvolvimento económico e que conta com a capacidade de gerar divisas para os países, redistribuindo o rendimento dentro do território nacional e dinamizando as economias regionais.

Nos últimos dez anos, a chegada de turistas internacionais cresceu quase um 70% a nível mundial, o qual demonstrava uma actividade pujante e vigorosa, que justifica uma importante percentagem do PIB do planeta. O estilo de vida orientado ao consumo próprio de nossas sociedades capitalistas, justificavam este crescimento sustentado e nos fazia achar que a actividade turística “não tinha teto”. Produto da pandemia, temos verificado sua inexistência, dado que todos e todas nos molhámos na tormenta.

No âmbito local, as medidas adoptadas pelo Estado Nacional, com seu corolario no Isolamento Social, Preventivo e Obrigatório (a famosa “cuarentena obrigatória”), supõe enormes impactos na economia em pos do cuidado dos cidadãos e cidadãs, com o objecto de “aplainar a curva” de crescimento de infectados e que o sistema argentino de saúde possa dar resposta em tempo e forma aos contagiados.

Neste marco, prima no sector o debate a respeito da maneira em que sair-se-á desta crise monumental. Por tanto, resulta importante pensar esta etapa como motor para identificar melhoras e trabalhar em conjunto com o sistema sanitário para prover confiança ao turista que deseje voltar a viajar uma vez superado o maior trance desta pandemia.

O visitante desejará e exigirá as condições máximas de salubridade para poder levar a cabo sua viagem da melhor forma possível, minimizando os riscos ao contágio. Aqui é onde se abre uma possibilidade para nosso país de se posicionar como destino seguro para os turistas internos, em primeiro lugar, e paulatinamente os viajantes internacionais que voltem a optar por fazer turismo, em tanto e assim que o regulamento de fronteira assim o permita.

Por tanto, os esforços investidos neste tempo em pos de evitar um colapso sanitário, redundarán em benefícios a médio prazo para quando a actividade recobre vigor.

Esta situação de crise deve-nos chamar à reflexão crítica respeito do funcionamento da actividade turística a nível mundial mas, de forma particular, no contexto nacional. Essa deliberación consideramos que deve se focar, por um lado, nas vias para sair da situação de emergência na que nos encontramos ainda que, por outro lado, também na posta em funcionamento do sistema turístico baixo uma lógica alternativa à que se desenvolveu até a actualidade.

Durante anos temos teorizado sobre o conceito de turismo sustentável. Esta circunstância histórica indica-nos que este é o momento para o pôr em prática, centrando nas demandas irresueltas que o sector ainda tem: maravilhas naturais desfrutadas por viajantes, mas não assim por comunidades locais submergidas na pobreza e exclusão; empregos precarizados e mau pagamentos, sem nenhum tipo de segurança social ou estabilidade; superpoblación de estudantes de turismo nas aulas de universidades e institutos terciários e déficit de profissionais em empregos de hierarquia do sector; mercantilización da cultura local para ser comercializado como parte de um produto turístico estabelecido por interesses alheios a essas comunidades; brecha salarial e “teto de cristal” por questões de género, entre outros tantos casos de assimetrias e práticas injustas que o sector tem tolerado e do qual tem sido parte responsável.

A hospitalidade é uma virtude própria do ser humano em todas suas culturas, ao longo de diferentes épocas, que explicava ao turismo tal como o conhecíamos até hoje. Se seu mercantilización produziu-se faz menos de duzentos anos mas existe desde faz milhares, resulta oportuno nestas circunstâncias deter-se a pensar qual foi seu fim primeiro e assim garantir sua sustentabilidade no tempo.

Esta pandemia força-nos a repensar nossa atividade e a maneira em que a levamos a cabo, para que esse dito tão mentado de que “em toda crise há uma oportunidade” tenha, desta vez, um correlato na realidade efectiva. Por tanto, convocamos a um chamado à acção por parte de todo o sector para que esta crise nos permita conseguir um turismo verdadeiramente sustentável, resiliente e que gere benefícios para toda sua corrente de valor, com especial ênfase nos trabalhadores e trabalhadoras e as comunidades locais.

Se conseguimo-lo, poderemos então dizer que este vírus nos permitiu sair de nosso individualismo e ser profissionais mais comprometidos com nossa realidade. Afinal de contas, quando tudo isto passe, essa devesse ser a valiosa lição aprendida.

 

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